Reflexões sobre a Resolução INSS n° 675, que institui bônus aos servidores do instituto
As entidades representativas dos/as servidores/as lutam há décadas pela realização de concurso público para repor o quadro de pessoal. Todos os governos do período foram alertados sobre as consequências para o INSS devido ao número elevado de servidores/as que estariam em condições de se aposentar em 2019, e apesar dos concursos realizados entre 2003 a 2016, estes foram insuficientes para repor o quadro de pessoal. Os efeitos são inevitáveis: apenas em 2019 já são mais de duas mil aposentadorias requeridas, aumentando o caos na autarquia e forçando os servidores a jornadas extenuantes com prejuízo ao atendimento à população.
O governo, sem um projeto estratégico com várias tentativas e experiências sem sucesso, ainda aposta todas as fichas no INSS Digital. A realidade, porém, demonstra que a digitalização desenfreada levou ao acúmulo de mais de 03 (três) milhões de processos represados, com média de 6 (seis) meses a um ano para serem analisados, números com perspectiva de aumento considerável caso não haja uma solução a curto prazo, podendo provocar descontinuidade dos serviços, conforme apontam nossas denúncias e os dados da auditoria feita pelo TCU em 2015.
Destaca-se que, após quatro anos sem cumprir o acordo de greve, os sucessivos presidentes, entre 2016 e 2019, não acataram nenhuma reivindicação da categoria e das entidades para solução ao REAT/Jornada de Trabalho, IMA/GDASS, nenhuma medida para avançar no plano de carreira, realização de concurso público e alteração nos processos de trabalho. Ao contrário disso, prometeram adotar soluções mirabolantes que efetivamente não solucionaram os problemas. A primeira seria o Teletrabalho, a segunda, e mais recente, é pagamento de Bônus por produtividade, para solucionar o número expressivo de processos acumulados. Nesse contexto, sem a perspectiva de recomposição dos salários, já que a Emenda Constitucional (EC) n° 95 congelou os salários por 20 anos, os/as servidores/as já enfrentam dificuldades financeiras.
A nova estratégia do governo vem com a Medida Provisória (MP) nº 871/2019, implantando o programa de análise de benefícios com indícios de irregularidades, mediante o pagamento de Bônus por Desempenho Institucional, com valor de R$ 57,50 (cinquenta e sete reais e cinquenta centavos). Tal valor seria pago aos servidores/as que se inscreverem no programa e concluírem processos represados ou com indício de irregularidade em horário extraordinário ou após ter cumprido 90 pontos. O atual presidente do INSS, no dia 21 de fevereiro de 2019, publicou a Resolução n° 675, fazendo a regulamentação do pagamento do bônus. No entanto, seu início depende de autorização das leis orçamentárias, o que nas últimas décadas tem ocorrido entre abril e maio.
A exemplo de outras iniciativas inócuas, o governo Bolsonaro apresenta o diagnóstico de que os atuais problemas do INSS são os benefícios fraudados que precisam ser cancelados, porém não disponibilizam nenhum dado que embase esta tese.
Ao nomear e generalizar os/as segurados/as como “fraudadores”, lavam as mãos, transferindo a solução dos problemas para os servidores/as que aderirem ao programa. É importante que todos/as os/as servidores/as se apropriem da resolução e a Medida Provisória 871/2019, bem como, o parecer da assessoria jurídica da FENASPS sobre a referida MP. É importante atentar ao contido no Art. 124C da referida Medida Provisória:
“O servidor responsável pela análise dos pedidos dos benefícios previstos nesta Lei motivará suas decisões ou opiniões técnicas e responderá pessoalmente apenas na hipótese de dolo ou erro grosseiro.”
Ou seja, a MP é bastante vaga a respeito do que seria “erro grosseiro“. Será que o/a servidor/a poderá ser responsabilizado? Observa-se que a MP descaracteriza o erro administrativo tornando qualquer falha do/a servidor/a passível de ser responsabilizada como fraude, além do risco de o/a servidor/a responder criminalmente. Neste sentido cabe uma profunda reflexão:
“Com as atuais condições de trabalho oferecidas pelo INSS e a pressão exercida no atual quadro deficitário de servidores, haverá tempo, condições hábeis técnicas, saúde mental e fôlego para a complexa análise de processos com indícios de irregularidade, sabendo-se das repercussões legais oriundas nesse tipo de procedimento?”
E ainda, cada processo cancelado poderá gerar nova demanda judicial a exemplo do que já ocorreu e ocorre com PRBI. Nesse caso, responde a autarquia ou o/a servidor/a que convalidou o processo e apurou a fraude, concluindo o processo?
Ao contrário da fábula, não existe pote de ouro no fim do arco-íris. Portanto, orientamos a todos/as os/as servidores/as para refletirem antes de embarcar em mais esta aventura. Além das punições e riscos citados acima, o governo poderá comprovar a viabilidade e possível retorno da jornada de oito a dez horas diárias, com novas metas de produtividade insanas, determinando para todos/as a jornada de trabalho de no mínimo 40 horas semanais, sem qualquer bônus.
O efeito perverso de tal política é aumento absurdo do adoecimento dos trabalhadores, pois na prática não haverá mais limite para jornada de trabalho. Se considerarmos ainda que o bônus não integra o salário, os/as trabalhadores/as afastados por doença terão redução brutal nos seus rendimentos, além do que os valores eventualmente recebidos a título de bônus não integrarão o cálculo da aposentadoria. Cabe destacar ainda que estes processos analisados não servem para medir o IMA/GDASS, gratificação que compõe a maior parcela dos salários dos/as servidores/as. Por fim, visualiza-se que muitos trabalharão mesmo doentes, e postergarão a aposentadoria para não terem redução salarial, piorando ainda mais as condições de vida e de trabalho.
Essa lógica implantada significa o fim da luta pela jornada de 30 horas semanais e o apoio à política em curso de destruição completa da política de Previdência pública, visto que pavimenta o modo como a autarquia se prepara para ser gestada como mais um produto bancário, afastando a lógica da política pública, social e de serviço ao cidadão, consolidando e fortalecendo os moldes com que se apresenta hoje o INSS Digital.
Ressalta-se a importância das entidades filiadas à FENASPS alertarem a todos/as os/as servidores/as sobre os riscos e problemas que estarão sujeitos, lembrando mais um fato determinante: em todo o país, em 2018, de acordo com o relato do diretor da Gestão de Pessoas do INSS, cerca de 8 mil servidores estavam em licenças, por motivo de saúde, superiores a 32 dias.
A FENASPS e os Sindicatos filiados continuarão travando a luta pela regulamentação da jornada de 30 horas semanais, realização de concurso público, plano de cargos e carreira que traga efetiva valorização profissional dos/as servidores/as. No entanto, temos uma grande batalha pela frente que é derrotar a contrarreforma da Previdência Social, que devasta e acaba com a maior política pública do país e prepara o caminho para a Lei Complementar que viabiliza o fim da Autarquia, com impacto direto nos direitos de todos/as os/as trabalhadores/as, incluindo nós, servidores/as.
Esse é um momento histórico na luta de todos os trabalhadores. Por isso é preciso que todos nós, urgentemente, mandemos um recado ao governo e as suas propostas paliativas de gestão da crise criada por eles em anos de abandono e precarização no INSS.
A luta que travamos é pela valorização profissional de todos/as os/as servidores/as do INSS, assegurando boas condições de vida e trabalho. A política implantada com a concessão de Bônus não atende nenhuma das demandas e nem reinvindicações dos/as servidores/as.
Fiquemos atentos!
É momento de lutarmos contra a reforma da Previdência e qualquer retrocesso dos nossos direitos!