terça-feira, 25/07/23

O CAOS NA GESTÃO DO INSS NÃO É CULPA DOS SERVIDORES E SERVIDORAS!

Editorial do jornal ‘O Globo’ põe a culpa das filas do INSS nos servidores, mas desconhece as causas do caos estrutural na Previdência Social (foto: Pedro França/Agência Senado)

Em relação ao editorial publicado pelo Jornal “O Globo” no último sábado, 22 de julho de 2023, intitulado “‘Bônus de produtividade’ no INSS é paliativo e adia reforma necessária” (disponível aqui, apenas para assinantes, mas com a íntegra no final da matéria) a FENASPS repudia a intenção de culpabilizar os servidores e servidoras do Instituto pelo caos institucional, pela gestão desastrosa do órgão nos últimos anos, bem como os graves problemas estruturais que assolam tanto os segurados que necessitam do INSS, como os servidores.

O editorial culpabiliza os(as) servidores(as) sem nenhum fundamento ou informações concretas, e demonstra total desconhecimento dos problemas estruturais da autarquia, os quais a FENASPS vem reiteradamente denunciando, especialmente nos últimos anos.

No referido editorial, o Jornal afirma que “os sindicatos gostam de dizer que faltam funcionários no INSS…”. Não se trata de uma questão de “gostar” ou uma questão de opinião dos sindicatos.

Trata-se de um fato, reconhecido até mesmo pela gestão do INSS que o atual quadro funcional atual do INSS é extremamente diminuto pelo tamanho e abrangência do órgão. O INSS possui mais de 1500 Agências e uma folha de benefícios na ordem de 37 milhões de pessoas.

Nos últimos sete anos, o INSS perdeu cerca de 13.000 servidores(as) do quadro funcional, por aposentadorias e outros fatores, conforme Gráfico nº 1 (veja abaixo). Contudo, os últimos governos ignoraram as orientações do TCU, MPF e das entidades sindicais sobre a urgência em realizar concurso público para repor o quadro funcional e evitar descontinuidade de serviços.

Além deste problema central, os sistemas de internet e parque tecnológico são ultrapassados e na maioria do tempo ficam inoperantes, impedindo que os servidores, mesmo em trabalho remoto, consigam cumprir suas atribuições ou aumentar a produtividade.

Gráfico nº 1: Quantitativo de aposentadorias de servidores e servidoras do Instituto Nacional do Seguro Social de 2002 a 2022.

Fonte: Base de dados INSS, elaboração própria, novembro/2022 (clique para ampliar)

A PRÓPRIA GESTÃO DO INSS RECONHECE O DÉFICIT DE SERVIDORES

Conforme destacado pela Fenasps, o próprio INSS reconheceu que o principal problema do Instituto é o déficit de servidores. Os servidores convivem com pressões para cumprimento de metas abusivas de produtividade, sistemas precários e alto índice de adoecimento da categoria.

Além destas questões, o referido editorial é totalmente parcial, quando não cita, por exemplo, que, mesmo com a redução brutal do quadro de servidores, a produtividade do INSS aumentou na ordem 30%, por meio de uma política de metas escorchantes e assédio moral institucionalizado.

Os últimos dados disponíveis mostram que de 2016 a 2019 houve um aumento de 39,30% para 64,7% no percentual de afastamento de servidores, justamente o período de maior redução de quadro funcional e implementação da política de metas.

Na prática, os Governos desmantelaram o atendimento presencial nas Agências de Previdência Social (APS) e apostaram todas as fichas no atendimento virtual, colocando 90% dos servidores na modalidade virtual, MEU INSS ou Call Center 135, retirando as filas presenciais e as tornando virtuais.

Conforme apresentação realizada pela gestão do INSS no Conselho de Previdência Social em março/2023, as filas tinham 7,1 milhões de requerimentos aguardando análise. Portanto, os erros de gestão é que levaram a este caos no atendimento aos segurados.

O pagamento de bônus por produtividade já foi implantado a partir de 2017 até 2022, porém não resolveu os problemas estruturais e gerências da maior autarquia do país, que precisa ser reestruturada para cumprir sua missão institucional que é atender os milhões de segurados que contribuem ao sistema previdenciário.

A FENASPS entregou dossiê (confira aqui) à equipe de transição de governo, em novembro de 2022, e a partir de janeiro para o atual ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, alertando sobre os riscos que o INSS enfrentava pelo seu desmonte e da empresa DATAPREV, havendo até dezembro de 2022 5,1 milhões de requerimentos nas filas.

TRABALHADORES SÃO HUMANOS, NÃO ROBÔS

Ainda, o jornal ‘O Globo’ não ouviu as entidades dos servidores para a publicação de seu editorial, que propôs beneficiar os servidores “produtivos e demitir os que não atendem as metas”.

Porém, falta informação e portanto a matéria não condiz com a realidade enfrentada por esta categoria que ao longo dos últimos sete anos foi obrigada a assumir as tarefas que seriam dos 13 mil servidores que se desvincularam do órgão e, como são seres humanos e não robôs, sofrem as consequências.

É importante que a população e toda sociedade tenha conhecimento dos reais problemas do INSS, agravados nos últimos anos com a política de austeridade fiscal e desmonte dos serviços públicos. O caos se instalou com os servidores trabalhando até 12 horas diárias para cumprir suas atribuições. Eles não são responsáveis nem parte do problema, e sim lutam todos os dias para serem a solução! Exigimos respeito a quem se dedica com esmero para atender à população brasileira!

LOBBY PARA A REFORMA ADMINISTRATIVA

O referido editorial cita de forma totalmente equivocada que a “solução” para o problema das filas no INSS seria a aprovação de uma Emenda Constitucional.

O que o jornal não cita, demonstrando mais uma vez sua parcialidade, é que a referida “Emenda” se trata na verdade da Reforma Administrativa, que tinha como seu objetivo principal dilapidar o instituto do concurso público e da estabilidade do servidor, favorecendo o retorno da prática de apadrinhamento e “rachadinhas” nos serviços públicos. Não é de hoje que a grande imprensa faz lobby para a realização de contrarreformas no Serviço Público.

Cabe destacar, que no período mais grave da pandemia, o que garantiu que a tragédia não fosse ainda maior foi o fato dos servidores públicos concursados e com estabilidade (independentes do Governo) denunciassem as piores práticas de gestão públicas que o Governo Bolsonaro tentou implementar, bem como a manipulação de dados e as tentativas de corrupção.

Não existem “milagres” administrativos ou gerenciais, bem como soluções por Emendas que na verdade mais aprofundam os problemas e retira a responsabilidade do estado na execução das políticas sociais. Do mesmo modo, a solução implementada pelo INSS continuará sendo insuficiente pois não se detém com os dedos os buracos e vazamentos em uma barragem de milhões de benefícios.

Somente quando o governo decidir enfrentar os problemas de frente, e não de forma paliativa, implementando as mudanças estruturais que a Autarquia exige é que poderemos mudar o atual cenário. Tais mudanças passam obrigatoriamente em mudanças no modelo de atendimento adotado, no concurso de novos servidores e na atualização do parque tecnológico.

Até lá, editoriais liberais e soluções de ocasião serão apenas duas faces da mesma moeda, contribuindo muito pouco para a angústia de milhões de cidadãos e milhares de servidores que mesmo adoecidos e cansados, desemprenham seu papel de forma extremamente competente.

Seguiremos na luta em defesa da Previdência Social e de seus trabalhadores(as)!

Confira abaixo a íntegra do editorial do jornal ‘O Globo’ deste sábado, 22 de julho:

“Bônus de produtividade” no INSS é paliativo e adia reforma necessária (Editorial)

Regras precisam mudar para premiar servidores que trabalham e punir quem apenas faz de conta


Diante de uma fila de quase 2 milhões de pessoas à espera de algum benefício previdenciário do INSS, o governo decidiu pagar um “bônus de produtividade” aos funcionários do instituto, para que trabalhem além do expediente e atendam um número maior de segurados. Seria tudo muito lógico e compreensível se esse adicional não fizesse parte do problema: a existência de uma grande e ineficiente burocracia dentro do Estado brasileiro, com estabilidade de emprego, salário garantido e sem estímulos para progredir na carreira.

Ao todo, são 1,8 milhão de requerimentos de benefícios (aposentadorias e pensões) e de perícias médicas (para incapacitados ao trabalho em busca de renovação da licença paga pelo INSS) que esperam há mais de 45 dias por uma resposta. O servidor receberá R$ 68 por tarefa feita depois do expediente, e os médicos R$ 75 por perícia adicional. A conta desta vez sairá para o contribuinte por R$ 129 milhões. Pode parecer uma emergência imprevista, mas não é. A mesma medida já foi tomada nos últimos anos pelo mesmo motivo.

Os sindicatos gostam de dizer que faltam funcionários no INSS, mas, sem estudos independentes sobre a produtividade desses servidores, não há como acreditar. Uma avaliação criteriosa precisaria ir além da média de requerimentos e perícias médicas realizadas por funcionário.

Seria necessário identificar quem são os que jogam essa média para baixo. Inatingíveis por estarem protegidos pela estabilidade no emprego, seguem em marcha lenta. É possível até que muitos esperem pelo bônus, que tende a fazer parte do orçamento pessoal.

Saída muito melhor seria pagar mais aos produtivos e demitir quem há anos faz corpo mole. Nas últimas três décadas não faltaram tentativas de elevar a produtividade do setor público. Na gestão de Fernando Henrique Cardoso, uma das metas era dotar o Brasil de uma burocracia pública moderna, regida por regras atualizadas. Não foi adiante.

O país voltaria a perder outra chance no governo passado, quando foi apresentada ao Congresso uma Proposta de Emenda à Constituição de aperfeiçoamento das regras dos servidores. As novas normas só valeriam para os servidores contratados depois da aprovação final da emenda. Também não seriam alterados os dispositivos que regem a magistratura, o Legislativo, membros do Ministério Público e militares.

A emenda conseguiu passar pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, mas encalhou, sem que Jair Bolsonaro trabalhasse no Congresso por sua tramitação.

Se e quando um governo resolver trazer o serviço público brasileiro para o século XXI, já existe ao menos um projeto. Enquanto isso não acontece, as filas do INSS continuarão a crescer e, de tempos em tempos, o contribuinte terá de arcar com novo bônus para desemperrar a máquina pública.

*Fonte: jornal ‘O Globo’.

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