Que gracinha, deputados querem curtir a copa em casa
Josie Jerônimo – Tiago Pariz
Quando as seleções da África do Sul e do México entrarem em campo para o jogo inaugural da Copa do Mundo, em 11 de junho, a maioria dos trabalhadores não poderá acompanhar a partida. Afinal, será uma sexta-feira, às 11h. Mas os deputados federais devem ganhar olga a partir do dia 10 para conferir o principal torneio do futebol mundial. O líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), anunciou ontem que levará ao colégio de líderes a ideia de antecipar o recesso da Casa, que só teria início em 18 de julho, para a agenda de trabalhos legislativos não se chocarem com a Copa. “A partir do dia 10 não vai ter ninguém mais na Câmara, porque vai ter Copa”, aposta o líder.
Segundo Vaccarezza, a proposta é correr para votar a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2011 até a primeira semana de junho, para deixar os deputados livres até o primeiro turno das eleições, em 3 de outubro. “A partir de 10 de junho, ninguém vai fazer com que os deputados venham aqui votar. A proposta que eu vou fazer no colégio de líderes é que a gente vote a LDO até esta data. Votada a LDO, nós vamos funcionar com esforço concentrado”, explica Vaccarezza. Em 2006, quando a Copa foi disputada entre 9 de junho e 9 de julho, os deputados não anteciparam o recesso. As faltas eram comuns.
Os impasses entre governo e oposição durante discussão de projetos na Casa não se repetem quando o assunto é a folga antecipada. A oposição apoia a sugestão de Vaccarezza. O líder do PSDB, João Almeida (PSDB-BA), disse que a proposta de se votar a LDO até 10 de junho vem sendo discutida nos corredores da Câmara. “Estou de acordo. A LDO é fundamental para a elaboração do Orçamento, não é disputa eleitoral, temos que dar uma sequência à LDO e não mentir a realidade. As convenções se realizam entre 3 e 30 de junho e os deputados ou vão ser candidatos ou terão alguma função de agente público. Vai haver um acordo. Não dá para mentir, tem eleição”, disse. Os deputados não podem entrar de recesso se a LDO não for votada até 30 de junho.
Dispersão
Apesar da franqueza do líder do governo em atribuir o esvaziamento da Casa à Copa do Mundo, os deputados desconversam e usam o mote das convenções para justificar a dispersão. “Se o assunto (o recesso branco) for debatido e discutido, se for possível, concordo. Normalmente, em ano eleitoral existem as convenções partidárias. Se não há como votar depois, é razoável votar a LDO antes”, disse o líder do PPS, Fernando Coruja (SC).
O desgaste na imagem já abalada da Casa preocupa alguns parlamentares. O líder do PSB na Câmara, Rodrigo Rollemberg (DF), criticou a proposta e disse que a LDO deve ser votada com cautela e sem afobação, sob risco de aprovar um projeto incompleto. Ele também alfinetou a idéia de recesso branco durante as eleições. “Deve ser respeitado o prazo legal. A Câmara tem que votar normalmente no meio da semana. A LDO tem que ser analisada com toda a calma e só ser votada com condições. Não se pode antecipar o recesso branco”, disse o deputado do PSB.
Mesmo sem adotar a estratégia do recesso branco durante a Copa do Mundo, o Senado também vai parar parcialmente, se a Câmara parar. O senador Pedro Simon (PMDB-RS) afirma que a “pausa” nos trabalhos antes da competição esportiva vai oficializar a paralisação do legislativo em função das campanhas eleitorais. “O governo quer entrar em campanha de qualquer jeito. Nas últimas semanas, o Congresso só tem se reunido duas vezes por semana, em meio período. Isso apenas efetiva o recesso que já ocorrer há muito tempo”.
Gabinete de Ciro é todo exonerado
A Câmara dos Deputados exonerou ontem à tarde os funcionários do gabinete do deputado Ciro Gomes (PSB-CE). Em 29 de abril, apresentando interesses particulares como justificativa, o parlamentar se licenciou do cargo. A administração da Casa considerou que, sem o deputado para ocupar o gabinete, não há razão para o pagamento de seus funcionários. A licença de 30 dias não dá direito de convocar suplente. Segundo a Constituição, os parlamentares têm direito a se licenciar por 120 dias no ano, sem receber remuneração. Como não há uma norma que regulamente a exoneração de funcionários em caso de licença parlamentar, Ciro pode, a qualquer momento, reverter a situação.
Eficácia de MPs em jogo
O recesso branco da Câmara pode colocar em risco a eficácia de pelo menos 11 medidas provisórias que ainda não foram analisadas e caducam na véspera ou durante a folga antecipada com que os parlamentares querem se presentear. Propostas sobre a doação de estoques de alimento para assistência humanitária internacional e a extinção do seguro habitacional estão ameaçadas e não poderão ser reeditas integralmente, caso os parlamentares não discutam o projeto até a data-limite.
De acordo com a secretaria-geral da Mesa Diretora da Câmara, 11 medidas provisórias estão com o prazo comprometido na Casa e outras quatro no Senado. O recesso branco é um artifício usado pelos parlamentares para se ausentarem do Congresso em ano eleitoral. Na prática, as Casas continuam funcionando, mas os líderes fazem acordo para não colocar nenhuma proposta deliberativa na pauta.
Quando algum assunto precisar de deliberação urgente, os parlamentares convocam sessão extraordinária e fazem o chamado “esforço concentrado” para votar a proposição no dia alternativo de trabalho.
Descontos
O recesso branco não compromete o rendimento dos parlamentares. Durante o período, as faltas não são levadas em conta. Nenhum desconto é feito na remuneração dos deputados e os benefícios relacionados à verba de gabinete e à cota indenizatória também são pagos normalmente. (JJ)