Golpe de R$ 3 milhões na Geap
Falsários abrem conta na mesma agência na qual a entidade é cliente. Por meio de ofícios fraudados, informam o número incorreto aos órgãos públicos que contratam planos de saúde e pedem o depósito dos pagamentos ali
A engenharia por trás do esquema intriga as autoridades. Conforme as primeiras investigações, ofícios timbrados contendo a assinatura do diretor executivo Antonio Carlos Conquista foram encaminhados aos órgãos públicos.
Esses comunicados pediam a troca da conta bancária, determinando que as contribuições fossem depositadas na suposta nova conta. Documentos frios teriam sido usados para justificar a mudança perante a instituição financeira. Dados pessoais de gestores e informações sigilosas, também. A falha no sistema motivou uma revisão geral do modelo de gerenciamento dos recursos.
Em resposta ao Correio, o BB justificou que as apurações estão em curso e não forneceu mais detalhes. Já a Geap reforçou que a assinatura de Conquista foi adulterada e que dados ou documentações frios acabaram acobertando o crime. A fundação reforçou, no entanto, que não trabalha com a hipótese de ficar no prejuízo. Segundo os madministradores, o dinheiro que deixou de entrar nos cofres terá que ser ressarcido por alguém. A fundação também não revelou quais patrocinadoras depositaram o dinheiro referente à contribuição mensal que garante o atendimento dos associados na conta paralela.
Pacotes de assistência
Conhecida no país inteiro por oferecer pacotes de assistência médica a baixo custo para o funcionalismo, a Geap atualizou neste ano a sua tabela. O preço do GeapSaúde, por exemplo, passou de R$ 115,19 para R$ 116, 82. O GeapClássico e o GeapEssencial ficaram mais baratos: o primeiro caiu de R$ 80,47 para R$ 78,77, e o segundo, de R$ 68,01 para R$ 65,71 por beneficiário ao mês. O GeapReferência manteve-se em R$ 54,50 a cada assistido. Os órgãos públicos que têm convênio com a entidade desembolsam R$ 72 por pessoa por mês.
Criada em 1945, com o nome de Patronal, a Geap mantém atualmente 90 patrocinadores e cerca de 700 mil associados, sendo que quase a metade deles com 60 anos de idade ou mais — 524 completaram ou passaram dos
100 anos. Os planos oferecidos não fazem distinção de idade. Ao todo, a rede possui 25 mil prestadores de serviço. Entidade fechada de previdência complementar sem fins lucrativos, a Geap atua como instituição privada, mas sofre com influências políticas e pressões dos servidores. Em novembro do ano passado, a ex-diretora executiva Regina Parizi foi demitida(1) do cargo para dar lugar a Antonio Carlos Conquista, ex-gerente de engenharia e administração da Petros, o fundo de previdência privada da Petrobras.
Nos últimos anos, a Geap vem tentando aperfeiçoar o atendimento. Alvo de reclamações de usuários que cobram a ampliação da rede de atendimento e a inclusão de determinados serviços de saúde, a entidade iniciou um agressivo processo de reorganização. Foram revistas parcerias e contratos. A fórmula de rateio aplicada aos planos também foi atualizada, o que desagradou aos associados que mantinham seus dependentes. Ao contrário do que acontecia no passado, os titulares passaram a ter de pagar proporcionalmente a mais todos os meses para incluir parentes nos planos. A alteração surtiu efeito positivo sobre as contas da fundação.
1 – Levantamento
A Geap foi submetida no fim de 2009 a um rigoroso processo de auditoria interna. As atividades da fundação foram averiguadas sob a ótica de regras de controle apropriadas à gestão. A ex-diretora Regina Parizi colocou o cargo à disposição por discordar da forma como foram feitos os estudos, questionando os critérios adotados nas investigações e os resultados envolvendo gerências regionais da Geap. As investigações tiveram início em 2005 e vinham sendo discutidas pelo Condel, órgão máximo da entidade.
Em outubro de 2009, o Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou o julgamento do processo que questiona convênios firmados entre a Geap e os órgãos públicos. A ação está parada desde fevereiro passado, devido a um pedido de vista do ministro Dias Toffoli. O assunto é polêmico e divide a Suprema Corte. O relator do caso, ministro Carlos Ayres Britto, votou pela manutenção do atual modelo, enquanto a ministra Carmen Lúcia optou pelo contrário. O ministro Ricardo Lewandowski também se posicionou contra, mas o ministro Eros Grau acompanhou o relator. Desde 2006, o STF se debruça sobre a questão.
Tudo começou com um acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) que contestou os convênios assinados pela Geap com órgãos diferentes daqueles que a instituíram desde sua origem. Para o Tribunal de Contas, os
participantes legítimos são apenas os servidores dos ministérios da Previdência e da Saúde; da Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social (DataPrev) e do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e somente eles podem contratar a entidade sem licitação. Os demais, conforme avaliação do TCU, têm de abrir concorrências públicas se quiserem oferecer a assistência da Geap a seus funcionários. A Procuradoria-Geral da República (PGR) também defende essa tese.Se os ministros do Supremo barrarem os convênios, cerca de 250 mil pessoas ficarão sem cobertura e terão de se associar a outro plano. Para o TCU e a PGR, a abrangência da Geap abre caminhos para um tipo de monopólio, uma vez que é uma entidade sem fins lucrativos que pode praticar preços de custo na oferta de seus produtos. Os repasses dos patrocinadores conveniados à Geap somaram no ano passado R$ 1 bilhão.
Fonte: Correio Braziliense –
Luciano Pires, Naiobe Quelem